É muito comum ouvir, em tom catastrófico, que a carga tributária no Brasil é alta, que ela é uma das causas do baixo crescimento do produto, entre outras afirmações. Mas uma análise mais detalhada deve levar em conta tanto a questão da distribuição da carga tributária por parte do Estado, quanto a comparação com a situação da carga tributária de outros países no mundo.
Para isso, é importante diferenciar dois conceitos: Carga Tributária Bruta e Carga Tributária Líquida. A carga tributária bruta é definida pela soma de todas as receitas recebidas pelos governos (Federal, Estadual, Municipal), dividida pelo PIB. Esse é o número que muitos “analistas” consideram alto.
No conceito “líquido”, entretanto, retira-se da carga tributária todas as transferências ( pagamento de Juros, Subsídios, Incentivo Fiscal, transferências), ou seja, retira-se todos os pagamentos do Governo que voltam diretamente para a sociedade. Dessa maneira, obtém-se apenas o que fica com o Governo para realizar seus gastos.
Nesse sentido, podemos perceber que a distribuição da carga tributária por meio das tranferências é altamente regressiva. No ano de 2004, mais de 18% do total arrecadado foi utilizado para o pagamernto de juros. Essa transferência de quase um quinto da receita tributária do governo é regressiva pois remunera os detentores de títulos públicos. Assim, se a carga tributária bruta realmente “pesa”, quase um quinto desse peso equivale a sustentação de detentores de riqueza na forma de dívidas do governo.
Outros 43% são distribuidos para os programas de Previdência Social, Subsídios, Incentivos Fiscais e outras transferências. Sobra, portanto, para os Gastos do Governo 39% da receita tributária. Na Espanha, por exemplo, 59% da arrecadação é dedicada aos Gastos do Governo e 4% para remunerar os detentores de títulos públicos.
Dados do Prof. Carlos Bastos (UFF), apresentados em seminário para o grupo Crítica Econômica demonstram que a carga tributária líquida brasileira é baixa se comparados com diversos outros países:
(Clicar na figura para melhor visualização)
Assim, para resolver a distorção entre Arrecadação Tributária relativamente alta e Carga Tributária Líquida relativamente baixa, só há dois caminhos. Ou se melhora os serviços do Governo via aumento dos Gastos e diminuição radical da parcela dedicada aos detentores de títulos públicos, ou se abaixa a carga tributária bruta ao reduzir radicalmente a parcela comprometida com os detentores de tais títulos. Não se pode discutir o problema da carga tributária no Brasil sem levar em conta o “peso” da classe rentista que todos nós temos que sustentar.
Primeiro gostaria de parabenizar pela construção do blog. Acho crucial um maior debate em relação às questões econômicas,por acreditar que hoje o Brasil caiu numa “cilada intelectual”, onde acredita-se piamente que a visão econômica é uma única, a ortodoxa. O desconhecimento da economia heterodoxa, aliada a sua pouquíssima divulgação pela mídia convencional limitam a visão política-econômica não só do povo, mas também de formadores de opinião que, sem conhecimento das reais alternativas não-necessariamente revolucionárias, acabam outorgando ao Brasil um tratamento ortodoxo de suas questões econômicas (e conseqüentemente sociais) sem questionamento algum. Torço para que a idéia nao fique restrita ao BLOG e alcance outros meios de comunicação.
Sobre o texto acima, porém, vejo com ressalvas o que foi teorizado. O que foi chamado de carga tributária líquida não deve ser parâmetro crucial para uma análise mais aprofundada no que diz respeito à carga tributária, que, ao meu ver, no Brasil é de fato muito alta.
Foi colocado que:
“No conceito “líquido”, entretanto, reitra-se da carga tributária todas as transferências ( Juros, Subsídios, Incentivo Fiscal, transferências), ou seja, retira-se todos os pagamentos do Governo que voltam diretamente para a sociedade.Dessa maneira, obtém-se apenas o que fica com o Governo para realizar seus gastos”
Aqui cabe o questionamento se os juros(principalmente), subsídios e até mesmo o incentivo fiscal (em menor escala) são realmente tranferências para a sociedade. A oneração para o custeio de altíssimas taxas de juros frutos de uma política monetária no mínimo questionável é danosa. Não vejo com clareza de que forma esse fluxo volte para a sociedade se a propensão a consumir (ao gasto) dos beneficiários é tão baixa.
Ademais, a carga tributária líquida vai ser subdivida em alguns gastos que devem ser melhor analisados, uma vez que o gasto com custeio de pessoal (da máquina governamental), com disperdício e corrupção representam parcela infelizmente significativa. O que sobra porém para o investimento e para pesquisa represensentem parcela ainda pouco relevante. A questão que segue é se o que deveria diminuir não seria exatamente os gastos com juros e com o financiamento da pesada máquina governamental ainda pouco atuante, visando a diminuição sustentável da carga tributária e ao conseqüentemente incentivo ao investimento privado e à melhoria do nível de emprego e renda.
Caro João,
Primeiramente, obrigado pelos comentários e desculpe a demora para responder.
De fato, os pagamentos voltam para a sociedade, mas claramente de maneira regressiva. O pagamento de juros, por exemplo, retorna para quem detém títulos públicos, e sabemos que não é a maioria da população. Isso seria uma segunda linha de investigação do trabalho que nos foi apresentado, ou seja, além de ser uma carga tributária líquida baixa em relação a outros países, a tributação aqui é altamente regressiva.
Ele volta sim para a sociedade, mas grande parte dele volta para uma pequena parcela da sociedade.
Também concordo que uma linha de investigação seria analisar a progressividade/regressividade dos subsídios/incentivo fiscal.
Ricardo Summa
Como sou autor dos dados postados pelo Summa, devo tecer alguns comentários sobre os comentários do João Marcos.
Respondendo ao que não tratei na mensagem postada pelo Summa
Eu não discuto, nem nunca estudei a “qualidade” do gasto público. Mesmo com essas duas ressalvas enormes, gostaria de lembrar que a “expressão” desperdício costuma estar associada, pelo menos da parte dos comentadores de direita, ao aumento do gasto corrente. Isto é, em princípio um absurdo. Aumentando-se o investimento em t na construção de escolas e hospitais é natural que em t+1 elevem-se os gastos correntes para transformar essa infra-estrutura, já construída, em algo operacional. Além do mais coisas que para alguns são desperdício (gasto com representações políticas locais, como câmaras de vereadores, por exemplo) para outros não são. Assim, se medir o desperdício não deve ser tão fácil, definir é mais complicado ainda. Nesse ponto é mais fácil para um conservador usar esse argumento do desperdício: para este a atuação do Estado é quase sempre um desperdício mesmo… .
Se definir e mensurar o desperdício já são tarefas complexas, imagina fazer o mesmo em relação à corrupção.
Para fugir desse papo em sala de aula e/ou palestras costumo dizer que isso é assunto para jornalista e polícia e que eu não freqüentei a optativa “Corrupção 101”. Logo, minha opinião é de leigo desinformado, mesmo porque, confesso, esse não é um assunto que me empolgue muito. Ainda assim, me parece que em termos de gasto, a corrupção representa um fluxo positivo para o setor público (latíssimo senso!). Normalmente, é o empresário que corrompe a “autoridade”, não? E para não me acusarem de excessivamente esquerdista: é o cidadão comum que “deixa a cerveja para a autoridade” e não o contrário. Concordo que é muitíssimo improvável que esse fluxo positivo vá parar, algum dia, nas contas do governo. Imaginar, entretanto, um fluxo negativo, é, pelo menos para mim leigo e desinformado no tema, muito improvável. Assim, a corrupção não passa de um sub-caso do desperdício: o corrompido faz gastos públicos ineficientes (desperdiçadores). Logo seria melhor o estudioso do setor público se dedicar a essa questão e deixar a outra, corrupção, para quem de direito: jornalista, polícia e justiça.
Vale anotar que pode haver um tipo de corrupção que representa não propriamente uma saída de recursos, mas uma queda de receita pública: quando o fiscal da receita ganha uma “bola” para deixar o empresário sonegar impostos. Entretanto, essa queda da arrecadação seria positiva para quem acha que a “carga tributária é muito alta e prejudica o investimento privado”. Uma forma de “corrupção do bem”. A esse tema específico voltaremos no outro comentário.
Como sou autor dos dados postados pelo Summa, devo tecer alguns comentários sobre os comentários do João Marcos.
Respondendo ao que originalmente (via Summa) tratei.
Primeiro questões não polêmicas porque definicionais. Citando
“Aqui cabe o questionamento se os juros(principalmente), subsídios e até mesmo o incentivo fiscal (em menor escala) são realmente tranferências para a sociedade. A oneração para o custeio de altíssimas taxas de juros frutos de uma política monetária no mínimo questionável é danosa. Não vejo com clareza de que forma esse fluxo volte para a sociedade se a propensão a consumir (ao gasto) dos beneficiários é tão baixa.”
Na verdade “não cabe”, se forem mantidos tanto os conceitos usuais de finanças públicas ou até mesmo um certo cuidado com o português. Não fui eu que cheguei à carga tributária líquida tirando subsídios. Foi o IBGE. Curiosamente o IBGE não tira juros, mas dizer que juros não é uma transferência é, no mínimo, estranho. Transferir é pegar de algum lugar, ou de alguém, e passar para outro ou outrem. Pagamento de juros é exatamente isso: tirar grana de todos e passar para os ricos. Gasto é quando um agente (governo ou não) dispõe de seu poder de compra para efetivar a aquisição de algum bem (de capital ou consumo) ou serviço.Dispêndio é a soma dos dois: transferências e gastos.
Para não dizer que isso vale no português e não no economês cito uma fonte insuspeitíssima. Em recente artigo publicado no IPEA, o Zé Roberto Affonso e seus parceiros (Boletim de Desenvolvimento Fiscal 04/IPEA) dizem:
“O que é sim possível de retrucar, recorrendo à macroeconomia clássica (sic?!), é que os governos devolvem às famílias parte da renda que delas subtraem a título de transferências, na forma de benefícios (previdenciários e assistenciais) e de juros da dívida pública. É inegável que, no Brasil, nos últimos anos, tanto cresceu a receita tributária, quanto os gastos com transferências de renda.”(p. 31)
Já que eu falei no Zé Roberto segue-se a essa citação uma passagem hilária no texto original:
“Mesmo neste antigo e esquecido conceito de carga tributária líquida, o aumento da parcela da renda nacional absorvida pelos governos, que automaticamente reduz a parcela do setor privado…”(p. 31)
Pode ser “antigo”(sic) mas deve ser mais novo que preço, renda … e, estranhamente, todo mundo continua usando estes…
E aí entra a segunda coisa engraçada: esquecido por quem? Ou mais precisamente: por quê?
Certamente pelo próprio Zé Roberto, que fez essa citação hilária mas não se deu ao trabalho de calcular o “submerged and fogotten” conceito. Talvez esse ato falho não precise do Freud para explicar, mas deixa p´ra lá… .
No fundo, a questão relevante não é de definição e sim de impacto macroeconômico. E aí a preocupação do João Marcos é correta. Como o dinheiro é transferido é claríssimo: rendimento das carteiras de fundos e outros ativos financeiros tendo como lastro títulos do governo. Bem mais obscuro, e importante, é o quanto dessa transferência é transformada em gasto pelos detentores da dívida em território nacional. Já que esse é o problema, vamos a outra questão do post.
Citando:
“A oneração para o custeio de altíssimas taxas de juros frutos de uma política monetária no mínimo questionável é danosa. … A questão que segue é se o que deveria diminuir não seria exatamente os gastos com juros e com o financiamento da pesada máquina governamental ainda pouco atuante, visando a diminuição sustentável da carga tributária e ao conseqüentemente incentivo ao investimento privado e à melhoria do nível de emprego e renda.”
Por que o conceito de carga tributária líquida é tão importante?
Por que aí sabemos o quanto DE FATO o governo retirou de poder de compra da sociedade, ou seja, o quanto sobra para ela investir ou consumir. Vamos a um exemplo absurdo: suponha que a carga tributária bruta é de 80% PIB e a carga líquida é de 0% e que esse resultado é explicado por um sistema muito regressivo (os pobres pagam proporcionalmente mais que os ricos) e no qual as transferências são compostas de elevados juros e, sei lá, uma “Bolsa Investimento”. Vamos supor que vale a Lei de Say (dos clássicos do Garegnani e não do Zé Roberto) e que a propensão a consumir dos capitalistas é zero. Nesse caso uma carga tributária BRUTA gigantesca seria extremamente favorável ao “..investimento privado e à melhoria do nível de emprego e renda.”(sic)
É muito importante analisar o conceito de carga tributária líquida para poder retrucar argumentos como o do Delfim na Carta Capital de 12 de setembro:
“O diagnostico quase unânime (obs: ele deve ter visto meu power point antes de escrever o artigo..) sobre a causa causans da redução do crescimento do Brasil sugere que ele é o resultado do aumento da apropriação de recursos que no passado eram muito mais produtivos nas mãos do setor privado”
Como nós, agora, sabemos que o governo DEVOLVE quase tudo que se apropria através dos impostos o argumento dificilmente se sustenta.
O que ele poderia estar querendo dizer é: estão tirando dos ricos produtivos/poupadores/investidores para dar aos pobres gastadores. Delfim e a tal da “quase unanimidade” tem igual horror à carga tributária e aos gastos com previdência.
Partindo do Delfim é, pelo menos, consistente com sua trajetória ideológica.
Outro ponto: a tal oneração e o investimento privado.
Para começar se essa é a preocupação, deve-se olhar não a carga tributária, seja ela bruta ou líquida, e sim, o impacto fiscal sobre o custo do capital. Suponha que a carga tributária é muito baixa, mas toda ela deriva de impostos que encarecem os bens de capital. Nesse caso o impacto da oneração no investimento é enorme mesmo para uma carga tributária, bruta ou líquida, baixíssima.
Mesmo nesse caso, que duvido seja o brasileiro, estaríamos enveredando, pelo no mínimo escorregadio terreno – quer dizer escorregadio nesse terreno virtual do blog Crítica Econômica – de relacionar investimento privado com custo do capital e não com demanda efetiva. Para a crítica aos neoclássicos vale remeter ao Prof. Serrano e para os Keynesianos, vale remeter ao Prof. Fagundes (que escreveu sua dissertação de mestrado sobre o tema). Deixo os argumentos para os mais sábios. Um ex-colega da pós da UFRJ (Marcos Thadeu, tese de mestrado) tinha corroborado empiricamente o argumento keynesiano/sraffiano. Recentemente, (TD IPEA 1297) o Cláudio Hamilton não testou nenhum modelo específico de investimento, mas achou, usando testes de co-integração, “a elasticidade da relação de longo prazo entre ivestimento e carga tributária” (com a palavra outra associada bem mais capacitada, Prof. Julia Braga)
Pode ser que a questão tributária tenha a ver com o multiplicador e assim indiretamente via acelerador com o investimento. Mesmo nesse caso, como nos mostra o Prof. Serrano no seu super multiplicador estar-se-ia falando sobre o nível do produto e não sobre a taxa de acumulação, ou de crescimento econômico.
Finalmente, a questão do tamanho relativo da carga tributária. Relativo, porque “ao ver” de cada pessoa, e a luz dos breves comentários anteriores, uma carga tributária é alta/baixa, em princípio, como uma relação comparativa com a de outro país Em termos absolutos, ser alta ou baixa só teria qualquer valor informativo relevante se quisesse dizer: prejudica/favorece o crescimento econômico (isso se não entrarmos em debates distributivos).
Como meus dados mostram, eu não “acho” a nossa carga tributária bruta alta. Outra pessoa pode “achar” diferente. Mas o “achismo” fica mais difícil, quase impossível, de justificar no caso da carga tributária líquida. É claro que o “achismo” depende da fonte. Eu não usei os dados do FMI que “achei” meios estranhos. O Zé Roberto usou. Usei da OECD. Mas não são dados de contas nacionais e sim de finanças públicas. No Brasil eu usei das contas nacionais do IBGE. Eu acho essas comparações “muito mais ou menos” relevantes. Sem relações macroeconômicas causais/funcionais claras fica uma discussão meio “concurso de beleza”. Contra-exemplo: o Abba Lerner que só quer saber do valor da alíquota tributária dentro do contexto de manutenção do alto emprego. Só botei a comparação para encher o saco dos “anti-imposto” que são mestres nessa técnica chatíssima de hand picking exemplos favoráveis. E por isso a carga tributária líquida é importante. Além de responder a conservadorismos mentirosos como os do Delfim, ela pode expressar uma opção social altamente desejável. Ou não.
Vejamos um exemplo: se eu não estou muito errado o Brasil tem uma Carga Tributária Bruta bem mais alta que a do México, mas uma líquida menor. Vamos esquecer por um momento os juros. Digamos que essa diferença fosse explicada pelas transferências de previdência. Se isso fosse verdade, seria algo muito positivo e progressista. Muito certamente estaria dizendo que a sociedade brasileira, como um todo, adota uma política de compensação às camadas menos favorecidas. Aliás, até hoje para mim é um espanto que uma sociedade tão conservadora e brutal como a brasileira tenha instituído e ainda não tenha conseguido acabar com a previdência rural.
E esse é o problema. O problema é que umas das boas razões para a carga tributária líquida ser baixa e a bruta ser alta é o fato dos juros serem muito altos combinado com essa política mongol de equilíbrio fiscal. O problema é a transferência de todo esse fluxo de renda para as classes proprietárias. Essa sim é a questão que pouco se fala: a brutal regressividade do nosso sistema. Como a gente viu no seminário no IE, possivelmente os ricos não pagam imposto no Brasil. O que, aliás, deveria gerar uma explosão de investimento, segundo certos argumentos.
Esse pequeno detalhe praticamente desapareceu do debate sobre tributação que sempre se foca em aspectos de eficiência e acumulação. Isso é que é o verdadeiro horror. Espero conseguir melhorar meus cálculos em breve.
Ué, caro Summa, logo que soube, por você mesmo, desse site, fui visitá-lo e tomei um susto! Meu apelido e meu endereço eletrônico apareceram na parte destinada aos comentários. Como quem já foi queimado com leite, quando vê a vaca, chora … Mas como o site foi recomendado por você, aqui vai minha obsrevação.
Porque não dizer que a caraga tributária é alta especialmente por causa dos juros? Por que não dizer que os juros comprometem fortemente a elevada carga tributária?
Me parece que fica difícil para as pessoas entenderem essa tecnicalidades de economistas, dessa seita de adoradores do mercado. Afinal, o que elas vêem é o elevado percentual de impostos sobre os preços dos produtos/serviços.
A crítica ao adoradores do mercado, das finanças, deve ser feita por eles esconderem que, ao reclamarem da carga tributária estão escondendo os maiores beneficiários dela. Que o discurso dessa gente, o de reclamar que é preciso gastar menos para se cobrar menos impostos é uma maneira solerte de esconder que eles têm, como pressuposto, que os benefícios dos rentistas é intocável e, portanto, pregam a redução dos outros gastos governamentais.
É preciso desmascar o discurso dessa gente, ao invés de ficarmos debatendo tecnicalidades com eles.
Um grande abraço,
Bensaiddeitapevi.
Reconheço que há no meu primeiro comentário, em princípio, uma “falha” em algumas questões definicionais. Desta “falha”(cujas aspas vou explicar em breve) partiu alguns comentários do professor Carlos Bastos, que me respondeu a algumas dúvidas e colocou pontos que me fizeram pensar e me ajudaram a esclarecer algumas questões em que talvez eu não tivesse pensando da melhor forma possível.
Me apresso em explicar a questão definicional “errada” para que fique claro o que eu julgo na verdade não ter se passado de um mal-entendido, causado por mim quando não me preocupei em “amarrar” alguns conceitos que usei sem apego algum à tecnicalidades.
Quando coloquei que: “Aqui cabe o questionamento se os juros(principalmente), subsídios e até mesmo o incentivo fiscal (em menor escala) são realmente tranferências para a sociedade.”
Para mim estava implícito que a palavra sociedade não estaria atrelada à simples agregação dos agentes privados, como é comumente usada. Definicionalmente, conforme o professor disse, não há sentido para se discordar de qualquer coisa nesse sentido. É definição, é fato(dado que não estou entrando no mértio da questão se os dados do IBGE são plenamente legítimos) e minha intenção nunca foi discordar disso.Seria irracional, seria muitíssimo estranho. Muito menos tenho a pretensão de questionar qualquer dado ou informação trazidos pela pesquisa do Professor Carlos Bastos.
A palavra sociedade foi por mim usada num sentido “não científico”, com a intenção de colocar a sociedade como se fosse a “nação Brasil”, num sentido “mais desenvolvimentista”.(entenda isso sem uma análise positivista)
Se eu fosse ser mais rigoroso, talvez pudesse ter abstraído esse trecho e substituído pelo o que o Ricardo Summa colocou; apesar de eu achar que ser muito técnico demais, conforme o “bensaiddeitapevi” (??) excelentemente colocou, é EXTREMAMENTE prejudicial para o debate crítico do país. Fica aí minha justificativa para o que causou um certo mal-entendido.
Outros erros definicionais eu assumo passivamente até por inadvertidamente não me preocupar com algumas tecnicalidades, apesar de reconhecer a importância delas para algumas discussões, evitando mal-entendidos (como acabou de ocorrer). Mas mesmo assim é sempre bom aprender (como aluno é a minha única intenção nessa discussão) e agradeço sinceramente às dicas do Professor.
As questões que seguem são sempre de impacto macroeconômico. Não vou entrar numa discussão agora profunda sobre corrupção e desperdício, pois, conforme o professor colocou é de difícil mensuração e foge um pouco ao assunto tratado inicialmente. Ainda assim, queria colocar que apesar do tema também não me empolgar em nada, é simplesmente inegável que a política (argh!) é de suma importância para o país. Sobre a corrupção porém, me parece claro que é de fato um fluxo negativo nas contas do governo, uma vez que o dinheiro público pode ser usado para corromper, mas as contas do Estado nunca serão as beneficiárias de qualquer outra forma ilícita de desvio de verbas. Acredito (com a humildade do criticado “achismo”) que o grande a corrupção gera dois grandes males para o país: o fluxo negativo (incluindo o nepotismo e os cargos de confiança a meu ver inúteis) e a manutenção de gente no poder descompromissadas com o desenvolvimento do país. Acredito ainda (assumidamente um achismo. Logo, assumidamente passível de crítica) que a corrupção no Brasil é infinitamente maior do que o apurado pelo jornal e polícia, ainda mais nas esferas municipais e estaduais.
Abandonando esse papo chato (porém crucial) sobre corrupção e voltando ao tema principal. O meu questionamento referente à utilização da carga tributária líquida como parâmetro único para mensuração do nível de carga tributária no país (dado que o título do post inicial é “A Carga Tributária no Brasil é Baixa”) segue em aberto. Não vejo ainda com clareza de que forma ela deve ser um bom indicador para dizer que o patamar de impostos no Brasil é baixa(dada a má qualidade dos dispêndios do governo). Não há como desvincular desta forma uma análise da carga tributária de uma questão qualitativa dos gastos. A questão é sempre em primeira e última instância de impacto social. Para mim (e eu gostaria que o professor me explicasse melhor) parece que os seus dados apresentados em seminário para o grupo Crítica Econômica visam simplesmente a “implicar” com alguns chororôs liberais, e não a manter um discurso defendendo a estrutura de impostos no Brasil e sua qualidade de dispêndio. Não?
Num primeiro momento, a interpretação do texto inicial desse tópico de discussão (que não é necessariamente igual ao que o professor Carlos Bastos pensa) assume o caminho inverso do que me parece ser a melhor interpretação possível (minha impressão)
Torço para que eu não seja mal-interpretado. Me esforcei para explicar tudo o que quis dizer, ressaltando quando se trata do que é apenas uma opinião ou impressão minha.
Colocando tudo isso, viso exclusivamente a desenvolver minha opinião sobre determinados assuntos e a colocar pontos que julgo poder acrescentar na visão de quem discute comigo.
Um forte abraço,
João Marcos Hausmann Tavares.
Caros BensaiddeItapevi e Jão Marcos,
Reescreverei o texto para evitar confusões.
João Marcos, acho que o que vc está querendo dizer é “a regressividade das transferências e não a qualidade dos gastos”. A carga tributária bruta não é baixa, mas também não é uma aberração em comparação com o mundo. Ela só é uma aberração se entendida como alta para manter tais transferências para os detentores de riqueza (títulos públicos), enquanto o que é gasto com a máquina em si (carga tributária líquida) não é alto, mas é a única variável de ajuste (junto com a s transferências garantidas por constituição para a previdência) que o discurso ortodoxo propõe. Se for isso, concordamos. Se não for, tenho pouco a dizer sobre “qualidade dos gastos”.
Aguardem o novo texto.
Abraços
Ricardo Summa
Exatamente!
[…] justificativa para a manutenção de uma taxa de juros básica tão elevada é decorrente da imensa tranferência de recursos do Governo para uma elite detentora de títulos públicos. […]
A alteração do texto ficou muito boa.
Para não distorcer os comentários anteriores à mudança no texto e gerar algum mal-entendido, sugiro que quando o escrito inicial for alterado (não só nesse tópico mas em qualquer outro), seja tomada alguma medida (nem que seja alguma explicação breve) que mostre que os comentários são antecendentes à mudança.
Texto modificado depois dos comentários 1 a 9.
Grande argumento.
Mas nao entendo porque nao descontamos tambem as despesas correntes da carga tributaria bruta. Afinal, despesas correntes tambem dao retorno a sociedade…
Alias, o mesmo argumento vale para as despesas de capital. Afinal, as despesas de capital tambem dao retorno a sociedade.
Portanto, creio que o conceito relevante para a carga tributaria liquida deveria ser a carga tributaria bruta subtraida de transferencias, juros, outras despesas correntes e despesas de capital.
Aposto que tal aritmetica provaria A+B que a carga tributaria brasileira eh negativa!! Esses neoconservadores devem ser loucos e lesa-patria ao fazer essa absurda campanha contra a tributacao quando temos uma carga tributaria liquida negativa!!!
Economista
P.S. Para aqueles que nao entendem ironia, o conceito de carga tributaria negativa nao faz sentido economico algum. Somente alguem que nao sabe bedelecas sobre financas publicas proporia um conceito de tributacao liquido, pois qualquer crianca sabe que os custos de deadweight da tributacao sao relacionados as taxas brutas de tributacao.
Carlos Bastos,
comecei a freqüentar este blog recentemente, mais precisamente esta semana e tenho passado grande parte do meu tempo por aqui. Como ex-aluna da pós deste instituto (conclui meu mestrado em 2004), fiquei extremamente satisfeita com esta inciativa.
Como co-autora do artigo do IPEA, que você cita em tom um tanto irônico, gostaria de tecer algumas observações. Antes de tudo, queria destacar que concordo quando diz que uma discussão mais relevante sobre a carga tributária (quando se especula se é alta ou baixa) deveria passar pelo impacto sobre a dinâmica macroeconômica. Neste sentido, como autora de uma dissertação sobre demanda efetiva e dinâmica macro (orientada pelo Possas) e grande admiradora do supermultiplicador do Franklin, concordo com você.
No entanto, o obejetivo do artigo era outro. Meramente estatístico. E a conclusão mais relevante se dá sobre a regressividade do sistema tributário, justamente o que você reivindica em seu comentário. A comparação internacional mais importante que mostramos é o alto peso dos impostos indiretos no Brasil em relação aos outros países.
A frase que se segue à citada por você é “Mas, também é inegável que a carga tributária atinge um contingente muito maior do que o de beneficiários daquelas transferências. Aliás, a carga atinge todos os brasileiros – ainda mais pela dominância dos tributos indiretos, cujos aumentos certamente são repassados em sua maior para os preços, numa economia fortemente oligopolizada como a brasileira. A grande maioria destes contribuintes não ganha por ser aposentado, pensionista ou bolsista, quanto menos rentista.”
Sobre este último ponto, tenho escrito sobre o mesmo tema que o último post do Ricardo Summa, sobre o perfil da dívida e a troca de Selic por Pré. Passei duas horas ontém fazendo uma conta pra mostrar que tal troca implicou um gasto com juros adicional de R$ 5 bi nos últimos 21 meses.
Para encurtar esta conversa, gostaria de sugerir que mudasse o tom de suas críticas. Ironias e deboches em nada contribuem para o debate. Isso muito me entristecia na época do IE, quando via que os competentíssimos professores e pesquisadores heterodoxos mal conseguiam dialogar. Este é o grande problema da heterodoxia.
Que tal mudar isso?
Um abraço cordial,
Bia
Prezado Carlos Bastos,
como seu ex-aluno (e talvez futuro) e co-autor do referido trabalho publicado pelo IPEA me sinto à vontade para dizer que o seu tom debochado sobre este trabalho em nada contribui para o debate.
Como a Bia citou no comentário anterior, o trabalho tinha um objetivo meramente estatísitico, além de destacar sim a regressividade da carga tributária no Brasil. Quando, no artigo, fizemos comparações internacionais, mostramos que o Brasil tem uma carga tributária sobre bens e serviços muito mais elevada do que os países ditos industriais – e como todos sabem, tributação sobre bens e serviços é muito mais onerosa, relativamente, para as classes menos favorecidas do que para os “ricos”. A regressividade no artigo está clara! Não da forma apresentada por você (carga tributária líquida), mas de outra forma – hilariamente, existem várias maneiras de mostrarmos a mesma coisa.
Aliás, você poderia passar a ler todos os trabalhos do Zé Roberto. Daí você veria que ele aborda essa questão de regressividade de outras formas: com base em estudo de Maria Helena Zockun (Fiesp), o Zé Roberto já mostrou a carga tributária por classes de renda – que para a sua não supresa mostrou que o mais pobres são os que mais pagam tributos no Brasil.
Acho que é importante sim destacar a carga tributária líquida e mostrar que as “transferências” são feitas de maneira regressiva. Mas simplesmente descartar e ironizar um indicador importante como a carga tributária bruta é, no mínimo, negligência.
E, com todo respeito (respeito mesmo, como já tinha te dito, você foi um dos melhores professores que tive na graduação), achismo por achismo, fico com o meu.
Um abraço.
Kleber
Na minha primeira participação nesta página, gostaria de trazer meu apoio à última intervenção da Bia, no que diz respeito ao tom das mensagens.
Acho que essa página poderá nos ser de grande valia, a nós economistas heterodoxos, caso os participantes mantenham o tom sustenido (essa é para o músico Carlos M.Bastos) em vez de enfraquecer seus argumentos com deboche. Afinal, isso não é Guerra nas Estrelas, e se fosse, acredito que a participação nessa página já implica um comprometimento com o lado “claro” da Força. Mas mais do que isso, pelo que consegui ver até agora, o alto nível dos participantes em termos de conteúdo não condiz com tons depreciativos (bemóis?), que agridem sem contribuir para a discussão substantiva que temos a rara oportunidade de ter aqui.
Um abraço ao Carlos e à Bia, ao Ricardo e a todos.
(quase que veio aquele final de missa: “que a paz esteja convosco.” Infância nas igrejas do Recife deixa marcas…)
Correção da postagem anterior: Maria Helena Zockun é da Fipe e não da Fiesp.
Caro Ricardo et alli,
depois da minha intervenção “religiosa” anterior, vai um comentário de conteúdo: quando você fala (e eu concordo, que fique claro) que “podemos perceber que a distribuição da carga tributária por meio das tranferências é altamente regressiva”, eu diria que não é só regressiva: é contrária às regras desejáveis a um sistema democrático. Explico:
As transferências:
1. aumentam a dependência dos governos subnacionais com relação ao governo central;
2. Muitas vezes (não é o caso do FPE/FPM, mas isso é exceção) são vinculadas no destino (como educação, saúde), com regras (no caso do salário-educação, por ex) de execução muito estritas, que não aumentam a autonomia de política econômica dos governos subnacionais;
3. Sua definição, em termos de valores e destinação final, é realizada pelo governo central.
Isso pra mim tem como pano de fundo a idéia de que os governos subnacionais são corruptos na essencia (como se no caso do federal fosse diferente), não podendo ser responsáveis pela definição dos recursos que recebem. Assim, tenta-se aumentar a parte de transferências e vinculações (ex Fundeb, EC29 da saúde), obscurecendo o fato de que dos recursos totais na mão dos estados e municípios, a parte livre é extremamente reduzida – deixando-os “de pires na mão”, e na situação de definir suas prioridades a partir da disponibilidade e condicionalidades dos recursos do governo federal (Cf. Sulamis Dain, “Como não fazer política fiscal”, na REP, e, mais recentemente, a tese da minha querida ex-chefe Sol Garson, defendida no IPPUR este ano e ainda não publicada). Esta situação é ainda agravada pela LRF, que coloca limites estritos a gastos de pessoal, e pelo Programa de Ajuste Fiscal do governo federal, que condiciona novos recursos à realização de superávit primário.
That’s all, folks, como diria o Pernalonga. Um abraço a todos. Peace be upon him (Ele, o Profeta).
Caro colega de inicio acredito que o problema esta na corrupção e no desperdício da receita publica. Mas:
– Quanto custa manter um político?
– Quanto custa realizar obras publicas que se arrastam por décadas sem fim?
– Quanto custa dar assistência a uma população massivamente analfabeta e crescente?
– Quanto custa ter altas rendas e riquezas concentradas?
Como será gerenciar o dinheiro publico baseado no interesse de uma minoria informada para uma maioria desinformada?
Eu não me importaria em pagar os altos impostos brasileiros se tivesse certeza de que eles chegariam ao seu destino que é o bem comum e principalmente se fossem bem utilizados.
Do IBGE – Diferença Carga Tributária Bruta e Líquida
1995 13,58
1996 13,33
1997 13,30
1998 14,95
1999 15,02
2000 13,40
2001 13,63
2002 14,05
2003 14,58
2004 14,14
2005 14,52
previdência
8,26
8,70
7,64
8,66
8,69
10,09
10,26
10,79
11,33
10,89
11,11
Os juros estão nessa diferença bruta- liquida também na previdência?
Todos falaram na alta ou baixa carga tributária brasileira, na corrupção, na carga bruta e liquida. Evidentemente que a carga tributária brasileira não é tão alta assim tanto que fica a desejar nas aplicações desse recurso. TEM DINHEIRO ? TEM,DEPENDE… MAS SÃO MAIS DE 190 MILHÕES DE BRASILEIROS A SEREM ATENDIDOS e AINDA, OS ORTODOXOS TIRARAM 40 BILHÕES DA RECEITA E DA SAÚDE (CPMF). Eu trago uma parâmetro que não foi dito , pelo menos não lí nada sobre isso, que é o excesso da BUROCRACIA, nas tranferencias, nas aplicações, nos investimentos desses recursos. ATÉ CHEGAR AO OBJETIVO quanto custa o PESO e o TEMPO dessa BUROCRACIA ? Podemos citar um dos principais custo. A CORRUPÇÃO. Creio que quanto mais BUROCRACIA mais probablidade de desvios e corrupções nesse caminho. ACREDITO QUE OS SENHORES JA CHEGARAM AO QUE EU QUERO DIZER POIS TODOS SÃO MUITO INTELIGENTES. Buscando a solução, não seria de bom senso uma reforma tributária em que transformasse tantas denominações e cobranças de tributos em apenas 4 tributos (FEDERAL,ESTADUAL,MUNICIPAL e PREVIDENCIÁRIO) ?. Evidentemente que estou sendo bastante simplório, a coisa é complicada, estou lançando apenas uma idéia para acabar com o EXCESSO DE BUROCRACIA , pegar mais facil os corruptos e baratear as despesas com essa máquina burocrática . IMPOSTO ÚNICO PARA MIM NÃO FUNCIONA E DEPENDENDO CRIARÁ DEPENDENCIAS. Acredito até que dessa forma poderíamos sim, com eficiência,fazer o imposto progressivo ( quem ganha mais paga mais ),,,, CONCORDO COM O RICARDO SUMMA, a carga não é alta para o País desigual que temos, acho até que deveriamos chegar aos 34% do PIB, sendo essa diferença aplicada às grande fortunas para ajudar no combate a pobreza e a miséria nesse País. Essa é a minha humilde contribuição,
Edilson